terça-feira, 4 de novembro de 2008

O caso é que eles decidiram, aos 14 anos, deitar todos juntos numa cama de solteiro que estava largada nos fundos da casa do Bugio, o dono do armazém com cara de lua espalhada. Bugio, esse era mesmo nome e não havia escapatória, pensava em Marlon Brando e Nick Cave quando usava a cama para suas práticas de final de tarde, o menino da empregada, calado, bem quietinho aí. Os três, não se sabe por que, mas há crédito no informante, presenciavam, rostos escondidos entre as mãos, por detrás da cerca dos fundos que dava para a janela do quarto onde estava a cama, presenciavam todas essas coisas, menino mais dono do armazém, e iam para casa logo após, apreensivos e de espírito exausto, como se tudo não passasse de um filme disforme, um susto, uma fatalidade que se aproxima dizendo olá.


- Ele gosta, é certo.
- Não, não é certo e ele não gosta, não é possível.
- Mas, veja bem, o que leva um menino grandão daqueles a deitar-se com um camarada pequeno, feio, dentes podres e tudo, o quê?
- Não, sei, Alex, não sei. Deveríamos saber essas coisas?
- Eu quero.
- O quê?
- Eu quero deitar com vocês dois naquela cama.
- Como? Como assim? Deitar ali pra quê? Fazer o quê?
- Aquilo. A mesma coisa. Quase. Eu sou menina. Acho que deve ser diferente.
- Ai, meu deus.
- Que foi, Leo?
- Eu não sei se eu quero isso.
- E o nosso pacto de sangue? Impossível, impossível. Vocês dois não podem me negar nada. Eu já vi o pau de vocês, eu já vi e se vocês me negarem isso eu vou contar para TODO mundo que vocês me mostraram essas coisas medonhas. Não estou brincando. Eu quero. Eu quero, e pronto.
-Ela não está brincando. Falou “pau” e tudo mais.
- Não mesmo, Caco, estamos ralados nessa.
- É, raladões, os dois.

Bugio saiu cedo de casa. Não se sabe como nem porque, não voltou. Até hoje ninguém mais sabe de nada sobre isso. A única coisa de que se tem certeza é de que Alex abriu a porta na ponta dos pés, estendeu um pano sobre a cama e despiu-se silenciosamente.


- Agora vocês.


Eles tiraram as roupas com os joelhos trêmulos, as idéias convulsas, as mãos cobrindo o sexo. Eles se aproximaram do corpo dela, como se estivessem os três se protegendo de um frio intenso. Encostaram os três rostos um no outro, tocaram os três pares de lábios como puderam e deram-se as mãos. Deitaram-se, assim unidos, sobre o pano vermelho de Alex. Nesse mesmo dia, não se sabe como nem porque, um menino forte, o rosto magro, fugiu com o circo.

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